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Elisa na Ilha do Sol - Capítulo 12

Amanhecia

Elisa havia perdido a forma de contar os dias. Tudo era surpresas, encontros, variações. Viu o sol de lá surgir por de trás das areias daquele deserto límpido e convidativo. Ela o havia visitado noutro dia quando sentiu saudades de ver o interior da Ilha. Foi muito bom ter estado ali durante um tempo incontável, mas que a marcou. Naquele novo dia a menina conheceria algo oculto por detrás de uma duna que insistia em não se desfazer por mais que o vento a convidasse a outras formações. Mas, é assim mesmo, quando insistimos, conseguimos. Elisa contemplava a duna e os raios multicores daquele sol que beijava carinhosamente aquelas areias que eram suas. Foi neste cenário impecável que um pássaro gigante pousou, desafiando a fortaleza da duna que não se desfez.

– Então posso ir. Decidiu Elisa.

Com cuidado e caminhar de anjo transpôs a distância, rodeou a duna e encontrou seu lado oposto. Havia um banco de metal. Sentou-se nele. Tinha levado um livro. Folheou-o. Queria mesmo ler ou estudar ou apenas, como fazia na infância: perpassar os olhos em volta para ver se alguém a observava, designando-a perspicaz. Enigmas que talvez nem ela saberia explicar. Em nós, a todo momento, surgem momentos anteriores. Quando o vivido anteriormente com o que se vive agora se encontram, costumam contradizer-se ou coadunar-se, como águas turvas ou límpidas. O livro tinha um título:

ATRÁS DO DELÍRIO

Há pessoas que buscam seus delírios em miragens insondáveis. Era necessário a Elisa, vencer seus delírios. Somente quem o faz consegue encontrar o real. Na Ilha do Sol, delírios são vilões inexpugnáveis, piores que serpentes ou escorpiões. Na página trinta havia apenas um refrão:

“Querendo se vê, vendo não se define.

O indefinível é o portal da conquista legítima,

Íntima daquele que sabe querer”

Um vento mais forte derrubou a coroa da duna que, sorrateira, desviou-se de Elisa e, ao passar, deixou um sussurro:

– Deixemos a mocinha estudar.

As dunas são parceiras das luzes. Elas as refletem. Assim a moça pode continuar sua leitura naquele amanhecer. Na página cinquenta encontrou:

“A força maior vem de dentro. De dentro se estabelece as ações. Quando encontra barreira, vence ou distorce, e, distorcendo, não é harmonia, é caos”.

– Será quem escreveu isto? Perguntou Elisa.

A harmonia dança em ritmos cadentes. O caos em voluptuosas danças e sons que se harmonizam também. A loucura tem lá suas harmonias. Os corpos físicos se desfazem na harmônica diluição dos tecidos e liberação dos átomos que, soltos, retornam à harmonia do Cosmos. Do caos se constrói a harmonia do cosmos.

– O que é a harmonia? De novo perguntou Elisa.

Na página setenta levou um susto:

– Se pensa que vai escapar eu entro em você e a destruo...

Era assustador. Elisa teve um pouco de receio. Não medo, porque, convenhamos que para se chegar à Ilha do Sol, a mocinha teve que vencer os seus medos.

A página cem era a última e nela não havia nada escrito. Apenas um enorme ponto de interrogação.

– Coisa enigmática. Falou Elisa para um velho sábio que passava por ali desapercebidamente. Ele sorriu e disse:

– Você consegue.

Que livro era aquele?

– O livro das Consultas. Disse-lhe um represente do seu próprio coração. O coração conversa conosco e é ele quem nos conduz à Ilha do Sol. Desta forma só chegaremos lá se ouvirmos os sussurros do coração quando está em paz. Elisa estava em dúvida sobre se conservar ou não aquele livro. Leu todas as suas páginas, destacou o que interessava e nós, como seu biografo, colocamos aqui. A esta altura a duna havia desaparecido e a menina estava só naquele deserto e não estava apreensiva e nem com sede. Desertos costumam dar sede em quem por eles caminham. Esses caminhantes solares e incompreendidos costumam bradar do alto das incoerências humanas:

– Tenho Sede!

Bom é quando não se oferece vinagre, tempero para as saladas. Os homens formam uma grande salada! Misturam muito quando deviam selecionar e qualificar, qualificando-se. Foi este o caminho que fez aquela menina receber sua herança. Qualificou-se! Agora era prosseguir, pois assim como semelhantes atraem semelhantes, qualificações buscam seus afins. Era isso que deveria fazer. Os desertos são convidativos ou a ânsias de sede ou ao saciar-se da água viva. A experiência no deserto é única e deve ser buscada como ermitão em consenso consigo e com as Leis. Cidades são muito barulhentas e amam impedir auto encontros.

– E se eu transformasse este deserto num grande lago?

Elisa sabia dos pontinhos e das cordas.

– E se tangesse cordas e amontasse pontinhos?

Elisa era construtora.

Foi num canto do deserto, juntou um bom punhado de areia e conectou a ela pontinhos e cordas e... Água! Em pouca quantidade, mas... Água!

Tentou fazer mais água, porém não conseguiu. Com certeza as cordas e os pontinhos exigem mais experiência e consistência e Elisa estava apenas começando e, para quem começa, o deserto é necessário. Pensando assim correu naquelas areias sem receio de se perder, afinal fazia parte da sua Ilha. Era de seu domínio e posse.

Havia uma montanha fora do deserto e Elisa correu até ela, subiu ao seu topo e, de cima, viu o deserto e pensou:

– Tenho que frutifica-lo.

A alma do deserto respondeu-lhe:

– Antes, porém sorva-me.

Naquele amanhecer Elisa conheceu o deserto da sua Ilha, ou melhor: parte dele. Era necessário voltar ali muitas vezes, passar uma noite inteira. Dizem que as estrelas disputam com os grãos de areia qual consegue brilhar mais e, a lua, tão amiga, anota quem vence quem. Tantos são os grãos de areia quantas as estrelas do firmamento. O trabalho da Lua deve ser muito difícil. Mas, o que é o difícil? Apenas o que não se consegue domar. E a Lua, tão distante, possui o olhar e a força domadora e é obedecida. É a Arizona que conduz a cavalaria, montada em todos eles, como agênere, como força. Como real.

Naquele amanhecer a menina-moça obteve lições magníficas. As dunas resistiram e esperaram por ela. As descobertas vencem as tormentas e nos aguardam. É enigmático ver os raios do astro brilharam nos grãos minúsculos e não os queimar, apenas dourá-los. Somos grãos minúsculos dourados pelo Astro Maior – O Cristo. Ele nos representa perante o Criador. Se formos ao deserto e não entendermos isso, de nada valeram a areia, as dunas e os raios. Elisa sabia disso.

O livro das Consultas está sempre disponível a quem deseja saber. As areias mostraram a ela que nem sempre se é água debaixo transformada pela água de cima até que se cumpram as eras. Cada ciclo um deslocar e isso é muito bom. As águas de cima criam e as de baixo mantém. É este o expressar do Concerto Divino! Somos todos pré divinos imersos em tudo isso e nada sabemos. Quem somos: transeuntes ou trânsfugas?

Amanhecia. Elisa foi para o Santuário. Era preciso agradecer e louvar.

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