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Elisa na Ilha do Sol - Capítulo 6

Na Biblioteca

Elisa fez uma descoberta necessária. Num dos nichos daquela Ilha havia uma biblioteca enorme, composta por milhares de livros. Eram tantos que não sabia por onde começar. Os escaninhos se organizavam e os assuntos neles também. O interessante é que se descobriu autora de todos eles. Havia muitos que estavam desorganizados precisando atenção. Tinha uma enorme mesa redonda e várias cadeiras que davam a impressão de já terem sido usadas. Elisa passou todo o dia naquele ambiente e a cada escaninho encontrava uma história aparentemente conhecida.

– Estranho. Pensou. Nunca estive aqui antes!

Havia um livro muito grande de sua autoria. Chamava muito a atenção. Elisa o pegou, assentou-se numa cadeira e fez uma viagem. Era menina de poucos milênios e sonhava ser alguém muito importante; por isso precisava ler muito, estudar bastante. Aquela cadeira transmitia-lhe essa sensação e mais que isso, uma vivência antiga que Elisa logo identificou. Ajeitou-se na cadeira e, quanto mais o fazia, mais as lembranças tornavam-se nítidas e elas falavam:

– Elisa, vamos brincar. Deixa isso!

– Elisa, se quiser progredir precisa estudar.

– Elisa, vamos sair, ver pessoas. Aqui é muito quieto e cansativo.

Era um grande material de pesquisa as conversas arquivadas naquela cadeira. Elisa levantou-se e sentou-se em outra. Viu a figura de um professor:

– No Condado de Marsch, no século passado, Meriane engravidou-se do seu padrasto, transtornando toda a sua vida...

– Importa considerar que cada historiador descreve a história de acordo com sua visão...

– Sabe-se que a proposta dos Sumérios era a de se constituírem em grandes cidades-estados, guarnecidas contra os assaltantes... Eram denominadas cidadelas...

Um pouco mais e Elisa viu a figura do Professor Afrânio – a quem muito admirava. Fora seu mestre num passado e sua imagem saltou daquela cadeira, inundando-a de boas lembranças. Assim, de cadeira em cadeira Elisa via um professor, professora, momentos juntos a livros, estudos, enraivecida umas vezes, tranquila noutras. O processo do aprendizado traz para cada um, emoções diferentes. A menina-moça queria mesmo saber o que tinha a mais naquele enorme livro de sua autoria. Sabia que muitas vivências antigas estavam descritas ali naquele volume tão grande.

– Devem ser bobagens da infância – Pensou.

Logo na primeira página deparou-se com um desenho de uma menina em meio a cometas, planetas e sois. Ela queria pegá-los e se esforçava para tal. Pretendia voar rumo aos seus inícios. Abaixo uma frase:

– Ainda os pegarei um dia!

Na página seguinte viu-se sorrateira penetrando um local desconhecido em busca de uma aventura que fosse bem perigosa!

– Gosto das aventuras bem perigosas, daquelas que arrepiam!

Noutra página viu a colagem de uma figura horripilante que comia crianças.

– Ah esses bichos papões!

Assim, de páginas em páginas, Elisa viu momentos da sua infância, lembranças que ali ficaram gravadas. Mas, ela queria entender aquilo. Por que que na sua Ilha havia uma biblioteca cheia de livros de sua autoria. Num canto havia um Mestre que olhava atentamente uma Obra de sua autoria.

– Interessante esta Obra. Devia publicá-la.

– Publicar?

Ela não entendeu bem.

– Sim. Conta a história de uma menina que resolveu criar uma própria identidade, saindo do jugo das pessoas e das circunstâncias que entorpecem e acrisolam. Isso pode ser de grande utilidade para outras crianças que insistem em permanecer naquele estágio.

– Essa história é mesmo boa? É que, na verdade foi um desabafo!

– Os grandes autores escrevem seus desabafos!

– Só assim as Obras ganham consistência?

– E também realidade!

Aos poucos a menina-moça se ia acostumando com as estranhezas da sua Ilha. Coisas absurdas ali aconteciam e muitas vezes fugiam do seu controle, mas, incrivelmente sentia que tudo aquilo a pertencia e não tinha receios, apenas curiosidades.

– Haverá um tempo em que conseguirá dominar toda a sua Ilha, disse-lhe o Mestre, desaparecendo em seguida.

Num dos escaninhos Elisa encontrou um livro que tinha o título: Agostinho.

Assentou-se numa cadeira fora do círculo da grande mesa. Era uma cadeira diferente, ornada com telas azuis e rosa e aveludada com a tonalidade verde claro. O espaldar era alto e parecia uma cadeira para princesas.

Abriu suavemente o livro cujas páginas eram adornadas com fios de ouro e letras em prata. As letras eram desenhadas e não escritas e traziam o perfume suave da virgindade física e espiritual. É-se assim na infância! A história teve início na página par:

“Saí de casa mais cedo. Mamãe fez um daqueles doces de sabor irresistível. Era minha isca. Embrulhei alguns num lencinho que tinha meu nome nele bordado. Quando os doces acabassem, meu nome permaneceria com ele. Cheguei no colégio. Os alunos estavam eufóricos. Mateus de Oliveira iria apresentar a peça extraída da Obra do Machado de Assis: Dom Casmurro. Agostinho – Bentinho. Elisa – Capitú. Par perfeito. A Peça seria apresentada em dois atos para troca de cenários e haveria um intervalo para o lanche. Nele, aproximei-me do menino meio padre, meio príncipe e ofertei-lhe o lencinho. Ele o tomou de minhas mãos, saboreou os doces e devolveu-me o lenço. Era ainda muito infante para as minhas pretensões”!

Elisa sorriu daquela história e disse um tanto enfadada:

- Eu me lembro. Participei disso. Mas, já faz tanto tempo e virou um livro?

Foi aí que de algum lugar surgiu uma ave nunca vista e que falava:

– Tudo fica guardado, para sempre!

– Santo Deus! Então todos estes livros contam minha história?

– Toda a sua história e o que aprendeu até aqui está nessa biblioteca. E são histórias de desde sempre. E, perpetuarão, expandido a Biblioteca para todo o infinito! Só se chega a Deus com ela infinitamente expandida.

– Um arquivo vivo!

– E o que é a morte? Só existe na cabeça dos mortos.

Elisa passou um dia muito estranho naquela biblioteca. Havia uma Obra que, ao abri-la, um som céltico se fez ouvir. Contava a história de uma flautista que encantava pássaros, atraindo-os para os cultos noturnos naquela floresta porque os pássaros adormecem muito cedo, privando-nos dos seus pios e cantares. Por isso a necessidade das flautas. Uma delas surgiu em suas mãos, trazida por sua vontade. A menina executou a mesma canção, fazendo um duo com a flautista da Obra e se encantou com aquele encanto de pássaros. Ao final, nobre personalidade aproximou-se de um grande altar feito de pedras e folhas e disse solene:

– Rogamos aos deuses celestiais a honra de iluminar este momento.

Vozes maviosas cantaram um hino à natureza, ali, absolutamente respeitada. Elisa se viu perante um druida em suas celebrações e sentiu-se plena. Era bom estar na sua Biblioteca. Mas, havia uma questão intrigante:

– Qual é a diferença do Portal das Estruturas para a Biblioteca? Ambos dizem as mesmas coisas! Perguntou-se Elisa.

– Na Ilha do Sol, as cópias aprimoradas se fazem. Livros são ecos das vivências. Estruturas são conformações das experiências. Os ecos são rápidos, ligeiros e passam. As estruturas ficam e marcam. Livros encantam. Estruturas solidificam e contam nos livros suas voltas e caminhos. Daí a necessidade das Bibliotecas.

Um grande livro foi escrito pelo Divino Autor e conta o início que ele criou, a princípio como verbo determinante, portador que é da magna sabedoria. Depois como mantenedor dos caminhos que construiu. Por ele Elisa caminhou e se fez e pelo qual deve ser sempre agradecida.

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