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Parte 3 - Capítulo 1: "A Mansão da Esperança"

O grupo havia gravitado, segundo suas afinidades, para uma Cidade Universitária, onde novos ciclos de estudo iniciariam. Era uma paisagem amena e sedutora, porém com muito luxo. Havia alinhadas as Academias, onde o suicida deveria se habilitar para as provas pessoais que seriam indispensáveis antes da nova encarnação terrena.


Impressionaram-se com o encanto que irradiava daquele bairro. Mesmo sendo apenas um grau a mais acima do triste asilo hospitalar, o local era sublime.


Pararam, emocionados, diante das Escolas que deveriam cursar. Lá estavam os letreiros descritivos dos ensinamentos a receber – Moral, Filosofia, Ciência, Psicologia, Pedagogia, Cosmogonia, e até um idioma novo, que havia de futuramente estreitar as relações entre os homens e os Espíritos, por facilitar o entendimento, removendo as barreiras da incompreensão entre os humanos, o Esperanto. A cidade chamava-se Esperança.


O frescor matinal trazia um perfume doce e os pássaros assobiavam ternas melodias.

Romeu e Alceste os apresentaram à direção e se despediram em seguida, dando por finda suas missões com aquele grupo.


Irmão Sóstenes, o diretor da Cidade Esperança, os recebeu com boas-vindas falando um pouco da nova etapa de muito trabalho e estudo, onde encontrarão no amor de Maria o sustentáculo para vencerem. Que deverão apressar a marcha e, recuperar o tempo perdido.


Após nada responderem, emocionados, foram levados ao Internato onde residiriam e, na manhã seguinte, saíram para passear. Viam algumas turmas de alunos ouvindo seus mestres pelos jardins, atentos e inebriados como antigamente teriam sido os discípulos de Sócrates ou de Platão na Terra.


Senhoras andavam pelas ruas, acompanhadas por vigilantes severas como Marie Nimiers ou

como Vicência de Guzman, jovem religiosa da antiga Ordem de S. Francisco, irmã do antigo benfeitor deles, Conde Ramiro de Guzman.


Camilo, João e Belarmino foram convidados por duas damas para uma reunião de honra dos chegaram no dia anterior, onde seriam apresentados aos seus novos mentores, que fariam sua educação definitiva, zelando por eles paternalmente até seu novo desencarne.


Uma das damas era uma menina loira e mimosa, de uns quinze anos. Trajava-se, porém, curiosamente: túnica branca atada à uma cinta, manto azul trespassado ao antigo uso grego e

uma pequena grinalda de rosas minúsculas na testa. Parecia um anjo sem asas.


Camilo achou que estava tendo uma alucinação, pois não viam criações belas há muito tempo. A menina era Rita de Cássia de Forjaz Frazão, de círculo familiar aristocrata na derradeira etapa terrena em Portugal. Ela havia sido sepultada em sua última encarnação conforme se apresentava agora.


A segunda dama, alta, também loira, uns cinquenta anos, simpática e atraente, estendeu a mão gentilmente, se apresentando como Doris Mary Steel da Costa... mãe de Joel, amigo do Departamento Hospitalar. Ficaram encantados e emocionados.


Foram conduzidos à sala de assembleias por irmãs vigilantes encarregadas do serviço interno.

A turma, que contava cerca de duzentos, era uma das maiores da Cidade no momento e era composta por um grande número de damas brasileiras, o que os surpreendeu, reconhecendo que as estatísticas de suicídios de mulheres no Brasil eram muito maiores que em Portugal.


Irmão Sóstenes presidia à reunião e começou evocando uma homenagem mental ao Criador, o que foi feito com respeito. À sua direita postava-se um senhor com ar venerável e à esquerda, outro iniciado despertou a atenção com seu perfil hindu clássico, tão venerável quanto o outro, porém, com menos idade. Mais além, um jovem quase adolescente ocupava outra cadeira de mestre e irradiava um perfil hebreu impressionante.


A um sinal de Irmão Sóstenes, iniciou-se a chamada dos pacientes:



- “Iniciam neste momento uma nova fase em suas existências como Espíritos delituosos, meus caros amigos! Dentre tantos padecentes que com vocês chegaram a esta Colônia, foram os únicos a atingir condições adequadas para encarar as lutas do aprendizado espiritual que lhes trarão uma base sólida para a aquisição de valores pessoais nos dias que virão. Serão matriculados em nossas escolas, uma vez que já apresentam o desenvolvimento moral e mental necessário para a aquisição de esclarecimentos que permitirão seguir para a próxima reencarnação recuperadora, capaz de fornecer a reabilitação do erro em que sucumbiram.


Como devem ter percebido, não serão condenados eternamente. Ao contrário, terão o direito de disfrutar da bondade paternal do Onipotente Criador cuja Lei por Ele estabelecida (que infringiram com o ato desrespeitoso da revolta contraproducente), concede a todos a possibilidade de recomeçar a experiência interrompida pelo suicídio, fornecendo honrosamente, a chance da reabilitação certa para cada um.


Porém, não conhecem nada da vida Espiritual e precisam conhecer. Até

agora seus estágios na erraticidade vêm sendo nas zonas inferiores onde têm aproveitado pouco moralmente, por conta da couraça de animalidade que envolve as suas vibrações mentais presas, principalmente, ao domínio das sensações. Então há cerca de um século chegou a época de se coloca despertá-los do círculo vicioso em que permaneceram, encaminhando-os para a redenção com Jesus, que os conduzirá ao verdadeiro alvo que, como criaturas de Deus, devem atingir!


Muitos de vocês foram muito cultos na sociedade terrena, mas desconheciam os mais básicos princípios da espiritualidade, levando a displicência ao extremo de negá-los e combatê-los. Devem, por isso mesmo, iniciar conosco um curso de reeducação moral-mental-espiritual, que é o que falta ainda, já que as predisposições para este alto feito já são visíveis e se efetivaram através dos apelos desesperados dos sofrimentos por que passaram.


Se não tivessem se precipitado, afrontando leis invariáveis, hoje estariam glorificados por vitórias magníficas, reconhecidos pelo cumprimento do Dever e preparados para novos ciclos de aprendizagem. No entanto, o suicídio, que não trouxe a morte, porque a morte é uma ficção neste Universo vivo e regido por leis eternas originadas da sabedoria de um Criador Eterno. A morte nessas bases não concedeu nem repouso, nem esquecimento, nem aniquilamento, e não atingiu nada mais que o corpo físico e não o espiritual, onde mora de fato suas personalidades verdadeiras e eternas. O suicídio, dizemos, levou todo o mérito que poderiam ter, colocando-os em situação calamitosa, da qual não sairão enquanto não sejam efetivadas restaurações totais.


E advirto-lhes, meus amigos, que as lágrimas que derramarão sobre as consequências do ato de desrespeito a vocês mesmos durarão mais de um século. Todavia, os ensinamentos que serão ministrados ajudarão bastante na vitória que deverão alcançar contra vocês mesmos. Não sairão daqui alçando esferas espirituais elevadas nem receberão certificados de reabilitação, isso somente será confiado a vocês após a reencarnação.”


Voltando-se para os três companheiros ao seu lado (Epaminondas de Vigo, Souria-Omar e Aníbal de Silas, um daqueles meninos presentes no grupo que Jesus acariciou quando exclamou, "Deixai vir a mim as criancinhas, que delas é o reino dos Céus..."), o orador continuou:


“- Aqui estão seus educadores. São como anjos-tutelares que sobre vocês e seus destinos se debruçarão, amparando-os na espinhosa jornada! Vão acompanhá-los, a partir deste momento, em todos os dias de suas vidas, e só darão por cumprida a nobre missão voltarem da Terra, novamente.”


Intensa comoção atingia as almas dos ali presentes, extraindo do íntimo reais sentimentos de admiração pelos três vultos que eram apresentados e que tão estreitamente se ligariam aos destinos por um tempo que se poderia prever.”


O três mestres haviam sido contemporâneos de Jesus. Conheceram-no, ouviram-no falar e falaram com Ele. Aliás, o Divino Mestre jamais negou falar a quem o procurasse!

Muitos internos presentes haviam baixado a cabeça, outros se entregavam às lágrimas silenciosas, discretas, que desciam, como num grato e fervoroso batismo! O silêncio continuou por alguns instantes, após o que Sóstenes continuou, orientador e zeloso:


- "Serão novamente divididos em grupos homogêneos de dez, continuando separados, como no Hospital, por gênero. Somente no decorrer das aulas ou em dias fixados para reuniões recreativas, poderão se encontrar e trocar ideias. Isso acontecerá porque trazem ainda arrastamentos penosos da matéria, inquietações mentais perturbadoras, que convém educar.


Seus pensamentos deverão habituar-se à disciplina higiênica. Farão conosco o exercício mental de elevação para o Infinito; mas para isso será preciso que não tenham preocupações mundanas.


A ideia de sexo é um dos mais incomodativos entraves às conquistas mentais! As inclinações sexuais oprimem a vontade, turbam as energias da alma, arrastada a vibrações pesadas e inferiores, que retardam a ação do verdadeiro estado de espiritualidade. Por isso, será prudente o isolamento, lembrando que, agora, deverão buscar o amor espiritual, o sentimento fraterno.


Mesmo assim, entidades que na Terra animaram corpos femininos são indicadas para acompanharem vocês em missão educativa e familiar. Escolhidas em o nosso grupo de vigilantes, auxiliarão na verdadeira adaptação ao ambiente espiritual, que ainda desconheceis, pois seus estágios no Além têm acontecido até agora apenas entre as camadas inferiores do Invisível, o que não é a mesma coisa...


Elas ouvirão as suas confidências, consolarão vocês com seus conselhos e experiências. Quando as fadigas ou as possíveis saudades ameaçarem seus ânimos, atenderão seus pedidos, transmitindo-os à diretoria e, agindo assim, manterão os sacrossantos sentimentos da Família, impedindo que sejam esquecidos por uma longa separação, pois não poderão descartar os sentimentos de família.


Tal como na Terra esses sentimentos serão experimentados porque reencarnarão ainda muitas vezes nos seus cenários, reconstituindo lares que nem sempre souberam respeitar, testemunhando ensinamentos que aprenderão no plano espiritual, com seus mestres, prepostos de Jesus.


Junto de vocês, elas desempenharão o papel maternal, e do interesse e da dedicação fraternais! Como veem, serão facultadas pela magna direção da Colônia Correcional que abriga vocês, toda a ajuda que a Lei permite.


Avante, então, caros amigos e irmãos! Encorajados e decididos, para a batalha que possibilitará a libertação das graves consequências que criaram “.


Em um salão anterior à sala de assembleias, encontraram as Damas da Vigilância esperando pelos seus protegidos, para serem devidamente apresentadas.


O grupo formado desde o Hospital por Camilo, Belarmino e João d'Azevedo, mais alguns outros aprendizes afins, portugueses e brasileiros, recebeu como futuros "bons gênios" as damas que os haviam encaminhado à reunião - Doris Mary e Rita de Cássia.


Encantados com o acontecimento e com irresistível simpatia por elas, comovidamente

confessaram a satisfação que sentiam ao beijar suas destras respeitosamente.


Sem perda de tempo, foram encaminhados para um dos magníficos palácios em que funcionavam as aulas de Filosofia e Moral, situados na Avenida Acadêmica.


Ao entrar na sala de aulas, comoção suave os agitou. Era um salão imenso, disposto com arquibancadas em semicírculo, ao fundo uma placa luminosa e, ao centro, junto a ela, a

cadeira do expositor. Notavam ser familiar o aparelhamento, ainda que aperfeiçoado, apresentando leveza e dimensões diferentes.


Suaves tonalidades branco-azuladas projetavam no ambiente o encanto dos santuários. Jamais sentiram tão profunda a significância ao penetrar no estranho anfiteatro onde o primeiro item a despertar atenção era o sublime convite do Senhor de Nazaré, escrito em caracteres fulgurantes e figurando acima da tela "Vinde a mim, todos vós que estais aflitos e sobrecarregados, que eu vos aliviarei. Tomai sobre vóso meu jugo e aprendei comigo, que sou brando e humilde de coração, e achareis repouso para vossas almas, pois o meu jugo é suave e leve o meu fardo." Mateus, 15:28, 29 e 30.



Eis, porém, que uma campainha despertou a atenção de todos. O mestre apareceu: era o jovem Aníbal de Silas, a quem fôramos apresentados havia poucos minutos. Vinha com dois adjuntos, Pedro e Salústio, dois adolescentes, como ele, delicados e atraentes, que imediatamente iniciaram preparativos para o magno desempenho.


Pensamentos vieram à tona na consciência de Camilo, deixando que recordações queridas da infância o aflorassem ao coração... e se viu pequeno, comovido e temeroso ao enfrentar, pela primeira vez, o velho mestre que o estimulou a conhecer as letras do alfabeto...


Os ajudantes ligaram alguns fios imperceptíveis, porém, luminosos à cadeira onde Aníbal sentou-se e prepararam um como uma tiara, semelhante ao visto na Torre, para elucidação de Agenor Penalva.


O silêncio era religioso. Percebia-se grande homogeneidade na assembleia, pois a harmonia se impunha, criando bem-estar indefinível a todos os presentes. Sofredores, excitados, aflitos, angustiados, todos aquietaram as reclamações e preocupações pessoais, aguardando a sequência do momento.


Sobre o tablado mais seis irmãos iniciados se apresentaram e sentaram-se dispostos em semicírculo, enquanto Aníbal se mantinha no centro e Pedro e Salústio se distanciavam.



Aníbal levantou-se. Surtos de esperança amenizavam as dores daqueles corações e vieram suspiros pelo alívio das opressões abomináveis. Ouviram harmonias de tocantes melodia, como um hino sacro, os predispondo a tirar do ambiente quaisquer resquícios de preocupações que ainda permanecessem pela atmosfera.


Instintivamente se viram envolvidos por profundo e singular respeito. Ondas

magnéticas preparativas eram conduzidas através dos sons daquele hino, que

unificava as mentes fazendo-os vibrar favoravelmente, num harmonioso estado de concentração de pensamentos e vontades.


Em meio a um silêncio sepulcral, ouviu-se a voz de Aníbal espalhando pela sala o convite enternecedor para a prece, como vigoroso recurso capaz de manter serenos os pensamentos frente às tormentas. Orando, o homem se apresenta, confiante e respeitoso, ao Pai Supremo, e dEle recebe o forças para seguir nas lutas rumo ao progresso e à luz! A oração impulsiona o pensamento às regiões festejadas pelas claridades celestes, e fortalece todos para o desempenho das mais árduas tarefas!


No intuito de iniciar os presentes no tema, Aníbal os convidou a estenderem o pensamento pelo Infinito, acompanhando o seu... Não importa que os delitos pesem nas consciências,

é preciso arrojar através da prece, para a comunhão mental com os planos superiores.


Aníbal orou e, à proporção que orava, uma faixa fosforescente, de radiação opalina, estendia-se sobre ele e a assistência, envolvendo a todos numa nuvem de bênçãos. O hino acompanhava docemente as palavras ungidas de fé.


Aníbal de Sitas sentou-se ao centro do semicírculo formado pelos seis iniciados que o acompanhavam. Pedro e Salústio colocaram-lhe na fronte a tiara de luz, ligando-a à tela. Um minuto de recolhimento e fixação mental entre o grupo de mestres e logo após, iniciou o

a sua importante aula.


Pela magnitude do que se passou, pela influência que exerceu sobre o destino, pelo desenvolvimento moral e mental e a importância do método pedagógico, será dedicado capítulo especial à exposição de Anibal e, ainda sim, só será possível apresentar um reflexo muito pálido do que foi presenciado.

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