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Parte 2 - Capítulo 7: "Os Primeiros Ensaios"

Atualizado: 9 de ago. de 2023

SEGUNDA PARTE

OS DEPARTAMENTOS


CAPÍTULO VII

Os Primeiros Ensaios


Quando Camilo se aproximou de terra natal, chorou entre as emanações pesadas da atmosfera, num misto de saudade, respeito e alegria. Faziam dezesseis anos do dia do suicídio!

Camilo quis percorrer sozinho as tão conhecidas e saudosas ruas de Lisboa, do Porto, de Coimbra, que tanto amara! Sentiu-se constrangido e triste quando sentiu que estava em liberdade.


Seu interior havia sofrido muitas mudanças neste período de reabilitação e sentiu-se tímido e apavorado ao estar novamente com aquela sociedade a quem amara e desprezara a um mesmo tempo.


De repente lembrou-se do drama que havia vivido. Lembrou-se dos que amou, dos que o amaram, e teve medo de buscá-los, visto a experiência de Jerônimo Silveira.


Camilo voltou com Belarmino ao antigo solar no qual este nasceu e viveu. O antigo professor de línguas conservava-se mudo e compenetrado, enquanto Camilo pensava demais e falava o tempo todo. O local já não pertencia aos de Queiroz e Sousa a quinta formosa, e sua mãe havia desencarnado. Belarmino preferia não ter voltado a Portugal... Sentia-se intranquilo e triste.


Sentiam cansados tristes e nostálgicos. Pensavam onde iriam repousar e ideia súbita fez Camilo pensar em Fernando de Lacerda, médium que tanto o ajudou e que mantinha contato todo esse tempo. Sabiam onde era sua casa, seu trabalho e suas reuniões mediúnicas.


Alguns dias de permanência ao lado de Fernando e já Camilo já se sentiu mais à vontade. Inclusive para, através de Fernando se oferecer para ditar um livro. O que trouxe incômodos e constrangimento para o médium na casa.


Camilo ficou desapontado com a negativa. Acreditava que rapidamente reconheceriam através do estilo de escrita e poderia ajudar a enviar notícias do Além. Mas nada adiantou. Entretanto, o convívio com Fernando era edificante.


Certo dia avistou o velho casarão e lembrou-se de todos os seus cantos. Lembranças terríveis

Faziam-no sentir, sofrer e reviver integralmente o que aconteceu ali. Reviu, sentindo os efeitos de todos os acontecimentos, até mesmo as cenas derradeiras.


Desorientado, perdeu a memória do presente, absorvido por retrospectiva. Quando voltou a si, Romeu e Alceste acudiam, ungindo sua testa com tônicos revigorantes.


Já era tarde da noite, Camilo se viu em repouso sob os arbustos perfumosos, triste.

Rogou aos seus Guias que o reconduzissem ao Pavilhão Indiano, onde se consideraria seguro de qualquer cilada da mente. Portugal enoitava seu Espírito, predispondo-o às sombras e sofrimentos que desejava esquecer! Mas não foi atendido, em benefício de sua própria reabilitação moral.


Imediatamente imagens formosas de dois jovens aparecerem lembrando as advertências de Roberto ao grupo, na véspera da descida para estas instruções: que procurassem refrigerar as faculdades atingidas pelo sofrimento, levando auxílio balsamizador a sofredores em mais críticas situações.


Camilo reuniu todas as forças, impôs serenidade aos sentidos abalados pelas emoções, buscou energias mentais recordando as invocações a Jesus Mestre Nazareno e orou pedindo socorro e proteção.


A solidão ao redor o apavorava. Ramiro de Guzman e Roberto de Canalejas apareceram para ajudá-lo e o reconduziram piedosamente ao modesto domicílio terreno, retirando-se em seguida.


Obediente, criou um tipo de "associação de classe" no intuito de estudarem e realizarem ações combativas às ideias de suicídio e às inclinações mórbidas no local. Quiseram no início ser vistos e compreendidos pelos homens, para ter amizades, conversas interessantes e elucidativas e troca de notícias entre os planos a fim de falar sobre o perigo desconhecido que representava o suicídio para a sociedade terrena.


Raros, porém, aqueles que em aceitaram suas ideias, ao contrário, os repeliam. Se eles tentavam narrar a vida para além-fronteiras do túmulo, os ouvintes desviavam as atenções para perguntar sobre interesses próprios ou temas mundanos.


Encontravam, assim, dificuldades para pôr esse plano em ação, quando surgiu o desejo ardente de irmos para o Brasil, país de campo vasto e fácil para os projetos, certamente muito menos preconceituoso do que Portugal.


Foram, então, encaminhados ao local almejado no novo país. Tratava-se de uma respeitada instituição, registrada no Mundo Espiritual, que serviria de padrão para as demais que se quisessem expandir no Brasil, e se dedicaria aos estudos e práticas das doutrinas secretas e à caridade. Iniciaram, a partir daí, uma luta árdua e exaustiva.


Tentaram aproveitar médiuns brasileiros para o trabalho – humildes, dóceis, afáveis, amorosos, sinceros no desejo de servir – e encontraram vários deles, que se poderiam ter tornado trabalhadores se não fosse a questão do idioma, com diferenças que representavam barreiras.


O desânimo invadia quando, uma noite em que se achavam reunidos falando tristemente do que tanto os preocupava, foram surpreendidos pela visita de Fernando em desdobramento, em pleno abrigo brasileiro. Estabeleceu-se então amistosa e útil conversa no

silêncio propício da casa. Fernando convidou-os a fazerem preces com mais frequência, criando meios de comunicação mais diretos com seus mentores, a fim de facilitar a inspiração permitida em cada caso.


Reforçou sua ajuda na causa do Suicídio e animou o grupo para que continuasse falando ao mundo por seu intermédio. E acrescentou, comovido e sincero, que a Caridade é sempre o mais fácil e mais rápido caminho para a Regeneração.


Disse que há na Terra muitos necessitados de ajuda fraterna. Nos hospitais, nas prisões, nas residências humildes, assim como nos palácios, se encontram sofrendo pela incompreensão e pelo desespero.


Fenando orientou que fizessem o pecador desistir do suicídio, em nome da experiência que passaram. Que apontassem o Amor de Deus como o bálsamo para as amarguras – aquele que desdenharam quando homens e hoje reconheciam como o único refrigério – a retirar a criatura da desgraça e enobrecê-la à luz da conformidade.


Que se tornassem consoladores, exercitando Caridade, enviando mensagens animadoras e reconfortantes aos corações sofridos, independente de quem fossem, pois eram muitos os que necessitavam da ajuda de corações sensíveis, bem-intencionados, por mais que fosse apenas com uma prece!


Sugeriu que a prece fosse feita e que contassem, sempre que possível, o que lhes havia sucedido, a fim de não passarem pelo drama que os endoidecera além das fronteiras da vida objetiva!


E quando, virtualmente, encontrassem médiuns cujas organizações vibratórias se adaptassem às deles, que não se preocupassem com o passado e não se envaidecessem por serem reconhecidos por seus discursos ou psicografias. Mesmo que afirmassem verdades, não seriam como eram anteriormente. Que então preferissem sempre as ações santificantes da Caridade discreta.


No dia seguinte à conversa com Fernando decidiram visitar hospitais, enfermos em gera.

Eram ao todo trinta entidades, divididas em três grupos distintos, imitando os métodos do nosso abrigo do mundo astral. Notaram que os pobres enfermos não só os percebiam em seus leitos de dores, como até às vezes até os ouviam, graças ao torpor causado pela doença.


Logo que foi possível, começaram a levar sua solidariedade, ora lhes inspirando conformidade no presente e esperança no futuro, ora procurando minimizar as causas morais dos muitos desgostos que resultavam no agravamento de seus males.


Belarmino, a quem a tuberculose levou ao suicídio, preferiu se dirigir aos enfermos dessa categoria, a fim de inspirar paciência, esperança e bom ânimo aos que assim expurgavam seus débitos vindos de existências antigas ou consequências desastrosas de despautérios do próprio presente.


Camilo, que cometeu suicídio por não aguentar sua cegueira, procurou cegos não só nos hospitais, mas também pelas ruas, para lhes servir de conselheiro, murmurando o grande consolo da Moral de Cristo.


João d'Azevedo, que se deixou levar pelo vício do jogo, voltou angustiado e oprimido aos antros em que se prejudicara, a distribuir conselhos prudentes a pobres dominados, no intuito de afastar do abismo ao menos um só daqueles infelizes.


A mente de Mário Sobral o arrastou para os cabarés, devido ao sincero arrependimento que o levou a querer reparações dificultosas. Quis demover jovens inconsequentes dos maus costumes que os ia escravizando, narrando a eles as próprias desventuras, no que não era absolutamente acatado, porque, nos antros onde a perversão reina as intuições de além-túmulo não se fazem sentidas, pois estão com seus sentidos mais animalizados, viciados por tóxicos materiais que se tornam barreiras que nenhuma entidade será capaz de remover a fim de se fazer compreendida!


Estenderam as visitas às prisões, obtendo êxito onde se elaboravam remorsos, no trabalho da meditação... E por fim invadiam domicílios particulares à cata de sofredores inclinados ao suicídio, e que aceitassem suas advertências através de sugestões benévolas. Sofreram porque o trabalho foi muito rude e pesado, mais possível pela sinceridade com que agiam e pela boa-vontade para o trabalho reparador!


Assim viajaram pelo interior do Brasil prevenindo contra a tendência impulsiva observada nos brasileiros, que resultava em um crescente número de suicídios. Receberam grandes lições durante as caravanas, iluminando suas mentes. Representantes da direção espiritual brasileiros, como o grande Bezerra de Menezes, lecionavam para eles, ao lado dos Mentores.


Via-se que Mário Sobral pensava no retorno imediato à encarnação, para resgates pesados, em meio familiar afinado com seu estado mental!



Mário faltava frequentemente às reuniões e caravanas elucidativas presididas pelos assistentes e às expedições de visitação aos sofredores, esquecendo-se dos seus deveres sagrados. Ao contato da sociedade terrena, se deixou brutalizar pelas antigas atrações mundanas e sentia-se arrastado para os locais degradantes que fizeram suas preferências de outrora e ia afinando-se com o passado. Já fora advertido várias vezes por Alceste e Romeu, que procuravam convencê-lo dos perigos daquela predileção para exercer atividades reparadoras.


Na manhã do terceiro dia Roberto de Canalejas os convidou a passear pelo parque em sua companhia. Advertiu, enquanto caminhavam, que o desânimo é sempre mau conselheiro, de cujas sugestões deveriam fugir, voltando suas vontades para a Força Suprema... e logo voltarão a ter forças para seguirem a jornada...


Disse ainda para não ficarem tristes diante do inevitável, para trabalharem! E buscarem na ação enobrecedora e honesta o restaurador Sempre haverá possibilidades, quer na Terra quando homens ou no Invisível como Espíritos, de servir ao próximo, cooperando para seu alívio e bem-estar. Roberto os convida a visitarem irmãos que sofrem mais do que eles e estão hospitalizados ainda, presos nas trevas.

Foram e o dia todo visitaram novos enfermos, dirigiram frases solidárias a pobres recém-chegados do Vale Sinistro, abraçaram Joel e outros dedicados amigos que se desvelaram por nós. À tarde, já de volta ao albergue, um emissário de Teócrito comunicou que no dia seguinte deveriam atingir a sede da Vigilância, reunindo-se a grande caravana que demandaria a Terra.


Romeu e Alceste zelariam pelos espíritos que iriam, mesmo que ocultamente, a fim de não os privar do mérito e da responsabilidade. Carlos e Roberto de Canalejas, Ramiro e Olivier de Guzman Anselmo integrariam o numeroso cortejo, incumbidos da precisão das instruções.


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